Produtores de castanha recebem formação sobre enxertia
Cerca de 20 produtores de castanha participaram no primeiro encontro associativo de técnicos e produtores de castanha realizado no dia 16 de abril em Valoura, no concelho de Vila Pouca de Aguiar. Esta iniciativa, promovida pela AguiarFloresta, incluiu uma vertente teórica e prática e procurou capacitar os produtores de castanha para a enxertia de castanheiros.
Duarte Marques, Presidente da
Direção da AguiarFloresta (Associação Florestal e Ambiental de Vila Pouca de
Aguiar), explica ao Notícias de Aguiar que este primeiro encontro teve como
propósito “dar mais formação e capacitação na área da enxertia, uma vez que o
castanheiro é uma cultura importante no concelho em Vila Pouca de Aguiar”.
Duarte Marques ressalva que na técnica da enxertia “há conhecimento e há muitas
pessoas que o fazem, mas é sempre importante conhecer as novas técnicas e
abordagens e partilhar conhecimento entre os participantes”.
Cerca de 40% dos associados
têm castanheiros
O Presidente da Associação indica
que a AguiarFloresta tem “mais de mil associados, e há um número muito
significativo que têm castanheiros, cerca de 30% a 40%”. Reforçando esta
indicação, o Presidente da Associação Florestal e Ambiental de Vila Pouca de
Aguiar lista as várias freguesias do concelho com presença de castanheiros:
“Valoura, Vreia de Bornes, Bornes de Aguiar, Tresminas, Alfarela, Vreia de
Jales e também no Bragado, Capeludos, Alvão e Telões onde também já começa a
haver, pelo que basicamente já há castanheiros em quase todo o concelho”.
A freguesia de Valoura foi
escolhida devido à sua cultura da castanha, clarifica Duarte Marques, e ainda
porque se insere numa Zona de Intervenção Florestal (ZIF). “A AguiarFloresta
tem uma entidade gestora de uma Zona de Intervenção Florestal (ZIF) que tem um
projeto em Área Integrada de Gestão da Paisagem (AIGP) que está em execução
aqui e, para além da beneficiação de vários terrenos, da gestão e limpeza do
mato e outras ações relativas à parte agrícola, a componente do castanheiro
também vai ser beneficiada, ou seja, os soutos também são áreas elegíveis”. O
Presidente da AguiarFloresta esclarece que, como consequência, a ideia é “dar
mais capacidade aos proprietários para beneficiar deste apoio que vai surgir no
âmbito da AIGP para melhorarem os seus soutos, aumentarem a sua produção e
terem mais rentabilidade das suas atividades”.
Devido às condições climatéricas
que deram tréguas, a atividade iniciou com a prática, no terreno, seguida da
componente teórica, quando a chuva voltou a aparecer. “O facto de ser uma ação
prática e demonstrativa, em que trazemos convidados experientes com
conhecimento nestas matérias, permite difundir as técnicas e conhecer as
dificuldades dos produtores, dando resposta à necessidade de ter mais
conhecimento em enxertias de castanheiro”.
Quanto à formação teórica, o
Presidente da Direção da AguiarFloresta diz que a ideia foi passar informação
sobre algumas características fisiológicas das plantas, como o castanheiro, e
quais as suas sensibilidades porque é “uma planta muito sensível e afetada por
pragas e doenças e, na execução destas atividades, tem de se ter em conta essas
situações complementares”.
“Há uma necessidade absoluta
de promover o desenvolvimento técnico da produção de castanha”
A RefCast, cujo acrónimo se
refere a “Reforço da Cultura do Castanheiro em Portugal”, é hoje a Associação
Portuguesa da Castanha. José Laranjo, docente na UTAD (Universidade de
Trás-os-Montes e Alto Douro), representa a instituição académica como Secretário
Geral na RefCast, uma vez que é “constituída por entidades ou pessoas
singulares”.
O objetivo da ação proposta pela
RefCast foi “procurar obter um maior envolvimento das associações e entidades
que são associadas da RefCast e também um maior aprofundamento técnico dos
associados (…) para que possam ajudar no desenvolvimento da fileira”. Para tal,
afirma José Laranjo, a estratégia passou por “criar estas jornadas técnicas da
RefCast”, que são organizadas pelas entidades e cooperativas associadas, sendo
que as primeiras foram planificadas pela AguiarFloresta, em Vila Pouca de
Aguiar, com a temática da enxertia em castanheiro. “Há uma necessidade absoluta
de promover o desenvolvimento técnico da produção de castanha para que se
produza castanha em quantidade e qualidade e de forma estável”, afirmou o
Secretário Geral da RefCast. “Este tema foi escolhido porque estamos na época
da enxertia”, esclarece.
O docente da UTAD faz uma
comparação ao “tempo dos nossos avós” quando os produtores de castanha “eram
basicamente coletores de castanha, na verdadeira aceção da palavra e hoje, cada
vez mais, quem tem soutos são coletores, mas são também produtores (…) que têm
uma carga técnica maior do que tinham na altura”. Desta forma, muda-se o
paradigma porque “hoje, pensando num souto moderno, temos de perceber que o
produtor tem um conjunto de tarefas a realizar durante a época vegetativa para
assegurar uma produção de qualidade e em quantidade”.
A enxertia no castanheiro é um
processo relativamente fácil, diz, mas “requer alguns cuidados para que haja
sucesso no pegamento”. José Laranjo clarifica estes pontos afirmando que
“estamos a falar de uma enxertia de variedades de castanha portuguesa, do
chamado castanheiro europeu e, agora, importam os enxertos híbridos que são a
mistura de castanheiro europeu com castanheiro japonês, que dificulta um bocado
mais o processo da enxertia, portanto os cuidados têm de ser maiores”.
“Adiam as enxertias porque não
encontram um enxertador”
Carlos Ramos é Diretor da
RefCast, representa a empresa SERVIRURI, e assumiu grande parte da componente
prática neste primeiro encontro de técnicos e produtores de castanha.
“Normalmente este tipo de eventos são muito teóricos e as pessoas acabam por
não se aperceber da maior ou menor dificuldade que se pode ter”, conclui Carlos
Ramos. Segundo afirma, a experiência acumulada da RefCast ao longo dos anos
levou-os a quererem demonstrar à população que as enxertias “são coisas fáceis
de se fazer” já que se depararam com algumas dificuldades nos produtores.
“Muitas vezes adiam as enxertias porque não encontram um enxertador a tempo ou
porque acham que os castanheiros ainda estão muito pequenos para enxertar”,
indicando ainda ao Notícias de Aguiar que se aperceberam de que as pessoas “têm
a ideia de que a enxertia é algo que elas nunca poderão atingir”.
Com os conhecimentos passados,
pretendem mostrar que “há intervenções que tanto podem ser feitas logo a seguir
à plantação do castanheiro, como passados dois ou cinco anos, e cobrem
perfeitamente este caminhar que o castanheiro leva”. Nesta linha, há uma
adaptação dos conteúdos às pessoas a que se dirigem para haver uma maior
eficácia na passagem das informações com base na ideia de que pretendem
“facilitar e não dificultar”.
Quanto à valorização do negócio
que esta ação irá trazer aos produtores, o Secretário Geral da RefCast diz não
ter dúvidas e acredita que ao apresentarem esta técnica e debaterem sobre ela e
ainda “o que podem ser pequenas nuances da sua execução, vai contribuir muito
para o sucesso da enxertia”. Por outro lado, a ideia é fazer uma “transição
suave daquilo que eram os porta-enxertos tradicionais para os novos
porta-enxertos híbridos, que são resistentes à doença da tinta de que também
falámos”.
“Naturalmente, o maior sucesso da
enxertia será, a médio prazo, o sucesso naquilo que é o investimento ou
recuperação dos soutos”. José Laranjo relembra que “o souto moderno faz-se, não
da produção em bravios, mas na produção em variedades e o mercado é cada vez
mais exigente nas variedades e na qualidade da castanha, que só é assegurada
com boas variedades instaladas em campo”.
Um outro aspeto levantado pelo
Diretor da RefCast é o de que a partir do momento em que as pessoas se sentem
confiantes com a enxertia, deixam de passar essa função a outros. “É uma
atividade simples, lúdica e viciante e as pessoas quando aprendem nunca mais
vão querer deixar que outros o façam por elas” e, com esses conhecimentos
adquiridos, acabam depois por aperfeiçoar a técnica, reforçou Carlos Ramos.
Sob a alçada do viveiro que detém
em Vila Pouca de Aguiar e onde tem castanheiros, Carlos Ramos explica ao
Notícias de Aguiar que a iniciativa vai também ao encontro de uma dificuldade
que têm sentido. “Somos procurados para venda dos porta-enxertos, mas logo de
seguida somos colocados perante a dificuldade de quem os vai enxertar e, muitas
vezes, fazemos milhares de quilómetros durante os meses de agosto e setembro
para andarmos a enxertar nos terrenos das pessoas”. Onde outros poderiam ver
uma oportunidade de negócio, Carlos Ramos prefere assumir outro pensamento.
“Quantas mais pessoas souberem fazer esta atividade [da enxertia], melhor, mais
facilmente terão acesso aos nossos porta-enxertos porque sabem que a seguir vão
saber tratar deles”.
Manuel Sarmento, produtor em
Carrazedo de Montenegro, na freguesia de Serapicos, não conhecia as técnicas de
enxertia demonstradas na iniciativa, “principalmente a de borbulha que nunca
tinha visto” porque o seu enxertador “tem uma técnica diferente”. Refere-nos
ainda que “cada vez há menos pessoas a enxertar” revelando uma dificuldade
atual dos produtores. Não contava ir para o terreno porque “habitualmente
é sempre em sala”, mas, na componente prática que considerou uma “mais-valia”,
também experimentou o novo processo, que vai começar a utilizar, passando os
conhecimentos adquiridos ao seu enxertador. Segundo disse ao jornal, espera
colher os frutos destes ensinamentos em breve.
Adesão de produtores dentro e
fora do concelho
Houve um sentimento unânime, de
todos os presentes, sobre o interesse e atratividade da sessão. Para José
Laranjo e Carlos Ramos, além da capacitação dos técnicos e produtores, a adesão
à iniciativa foi inesperada tendo motivado a deslocação de produtores e
técnicos tanto do concelho de Chaves, como até mesmo de fora, como Régua,
Bragança e Ferreira do Zêzere. Também o envolvimento dos presentes foi visto
com agrado, uma vez que “apesar de quase todos saberem fazer enxertias, há
sempre coisas novas que se aprendem nestas jornadas”, disse José Laranjo.
Carlos Ramos reforçou “fiquei muito admirado com a adesão a este evento e com a
vontade e curiosidade em verem o que estávamos a trazer de novo, porque
trouxemos coisas diferentes daquelas que normalmente veem fazer”.
Paulo Santos, Presidente da Junta
de Freguesia de Valoura ressalva que “a AguiarFloresta tem aqui uma ZIF, na
zona da encosta da Valoura, e a causa foi muito útil porque as pessoas têm
investimento nos soutos e no castanheiro e se estiverem bem informadas de como
se faz o enxerto, é uma mais-valia para a produção futura”. Afirma ainda que,
com a AguiarFloresta como parceira, se sente “orgulhoso” por poder ajudar os
produtores da sua região com iniciativas que os apoiam.
No seu plano de atividades e com
temas do interesse dos associados sob a alçada das AIGP, a AguiarFloresta tem
previstas mais ações, nomeadamente na área da silvopastorícia e do pastoreio
extensivo, do sobreiro e da cortiça, do pinho, e do medronho que, apesar de
ainda não ser uma “cultura muito expressiva tem muito potencial”, conclui
Duarte Marques.
A RefCast também já planeadas
novas ações de capacitação em breve, que pretendem que sejam de caráter
bimensal, e a próxima será no concelho de Murça sob o tema do cancro.
Texto e fotos: Ângela Vermelho
22/04/2025
Sociedade
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